Por: Larissa Freitas Ribeiro, Mellissa Freitas Ribeiro, Giovani
Magalhães*.
RESUMO
A partir
da presente pesquisa, busca-se analisar o posicionamento da doutrina e
jurisprudência brasileira acerca do instituto da ação de imissão na posse.
Objetiva-se identificar a viabilidade da utilização dessa ação na defesa da
posse, sob a égide do Código de Processo Civil de 1973. Apresentou-se um histórico
dessa ação no ordenamento jurídico brasileiro, verificando e constatando a
divergência jurisprudencial e doutrinária que a envolve desde 1891. O enfoque
metodológico da pesquisa é de natureza qualitativa, quanto aos fins,
exploratória, e no que se refere ao tipo, bibliográfica. Assim, torna-se
possível verificar o conflito existente entre sua natureza, se ela é uma ação
possessória ou petitória, evidenciando quais as consequências serão acarretadas
a depender do modo que a ação de imissão na posse for enfrentada.
Palavras-chave: Ação de
imissão na posse. Possessória. Legitimidade das partes
1. INTRODUÇÃO
A ação
de imissão na posse sempre teve sua compreensão envolvida em inúmeros
conflitos. Devido a tantas divergências que se apresentam, envolvendo esse
instituto, muitas vezes ele deixa de ser utilizado, passando a ser elencado
apenas como um dos pedidos presentes na petição inicial.
Os
querelantes, mesmo sabendo que a fase executiva dessa ação é mais célere e
eficaz, utilizam-se da ação reivindicatória, pois temem qual será o
posicionamento do magistrado que irá enfrentar a causa, visto que, a depender
do intérprete a legitimidade das partes e o interesse jurídico pode variar
bastante.
Nesse
diapasão, aborda-se essa demanda relacionando as inúmeras interpretações que
poderão ser atribuídas no estudo da ação de imissão na posse.
2.
NATUREZA DIVERGENTE DA AÇÃO DE IMISSÃO NA POSSE
Em todas
as ações possessórias para que o autor possa propô-las é necessário que ele
manifeste, ou tenha manifestado vínculo possessório com o bem, diferentemente,
na ação de imissão na posse não há o pressuposto do exercício da posse. Aqui o
autor nunca foi possuidor, mesmo tendo o direito de ser, ele ainda não
conseguiu exercitar posse. Através dessa ação busca-se uma autorização judicial
para que o interessado tenha condições de entrar no exercício da posse.
Devido a
essa peculiaridade a ação de imissão na posse é uma ação de natureza
divergente, pois alguns doutrinadores a classificam como uma ação possessória e
outros como ação petitória. De acordo com Tito Fulgêncio (2000, p. 305), os
estudiosos que acreditam ser pressuposto para todos os interditos uma posse já
adquirida, e, portanto, ação possessória não pode ser a que tende a aquisição
da posse está atrelada a um resquício da doutrina de Savigny. No mesmo sentido
posiciona-se Maria Helena Diniz (2010, p.94), quando postula que a titularidade
do direito à posse, que foi violado, é o pressuposto para as ações possessórias.
Diferentemente, Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald (2010, p.153)
acreditam ser a ação de imissão na posse uma ação tipicamente petitória. Para
Tito Fulgêncio (2000, p. 305) o traço distintivo dos interditos possessórios
são as reivindicações possessórias.
Prepondera
nos tribunais brasileiros o entendimento de ser a ação de imissão na posse uma
ação petitória. É o que se observa no voto proferido pelo Ministro Sidnei
Beneti relator do Resp 1211073/RS “a ação de imissão na posse pode ser
conceituada como um meio processual posto à disposição do proprietário para
obter a posse do bem (natureza petitória)”. Seguindo o mesmo viés a Ministra
Nancy Andrighi, ao ser relatora do Resp. 404717/MT, leciona que “deve-se
observar que a ação de imissão de posse possui natureza petitória e não
possessória, pois é manejada por aquele que detém a propriedade e busca a
posse”. Análogo entendimento vem sendo adotado pelo Egrégio Tribunal de Justiça
do Estado do Ceará, como se visualiza no voto da Apelação Cível
n.4489505.2003.8.06.000/0, a qual teve como relator o Desembargador Rômulo
Moreira de Deus, “a ação de imissão de posse, que tem índole petitória e não possessória,
é a ação própria para se conceder a posse a quem nunca teve, mas pretende
obtê-la com fundamento no domínio”.
Observam-se
as contradições e peculiaridades que se apresentam em face do estudo dessa
ação. A relevância de se desenvolver um pensamento equânime acerca da natureza
dessa ação justifica-se, pois, conforme o entendimento dado a natureza da ação
modifica-se o seu trâmite processual, visto que, se entendida como uma ação
possessória será conferida ao autor o direito de uma liminar, diferentemente,
se for encarada como uma ação petitória não gozará o autor desse pressuposto,
no entanto, em ambas as situações são relevantes ressaltar que a tutela
antecipada pode ser concedida.
3. ANTECEDENTES HISTÓRICOS NA
LEGISLAÇÃO PROCESSUAL CIVIL BRASILEIRA
Sob a
égide da Constituição de 1891, quando as leis processuais ainda eram elaboradas
pelos Estados Membros e pela União, alguns códigos de processo estaduais
elencavam a ação de imissão na posse em seu rol, outros não. Nesse diapasão,
iniciou-se uma acirrada discussão doutrinária, pois se questionava a atuação do
poder legislativo estadual, o qual era legitimado a legislar apenas acerca de matéria
processual, estaria extrapolando essa permissibilidade e estava adentrando na
esfera do direito subjetivo, visto que, o Código Civil apenas abordava a ação
de manutenção de posse, reintegração de posse e interdito proibitório. Nesse
cenário, fora negada a existência da ação de imissão na posse abarcavam todas
as possibilidades que poderiam ser ocupadas por essa ação.
A
Constituição de 1934 atribuiu primordialmente à União e supletivamente aos
Estados a competência para legislar sobre matéria processual, com essa
modificação, em 1939 fora promulgado o Código Nacional de Processo Civil o qual
incluiu expressamente, em seus arts. 381 a 383, a ação de imissão de posse. O
art. 382 postula que a ação de imissão de posse deveria fundar-se em título de domínio,
ou nos documentos de nomeação ou eleição do representante da pessoa jurídica,
ou, finalmente, no documento da constituição do novo mandatário, sendo assim,
observa-se que essa ação fora concebida como petitória.
O art.
381 do Código de Processo Civil de 1939 disciplina que a ação de imissão de
posse compete aos adquirentes de bens, para haverem a respectiva posse, contra
os alienantes ou terceiros, que os detenham; aos administradores e demais
representantes das pessoas jurídicas de direito privado, para haverem dos seus
antecessores a entrega dos bens pertencentes à pessoa representada; aos
mandatários, para receberem dos antecessores a posse dos bens do mandante.
Devido a
esse dispositivo, apresentou-se uma grande questão a ser debatida acerca da
legitimidade passiva na ação de imissão de posse, visto que, o dispositivo
proclama que caberá essa ação contra o alienante ou terceiros que o detenham.
Enquanto ao alienante, não há dúvida, nem maiores questionamentos. Todavia, no
que trata aos terceiros, discutia-se se esse “o detenha” referia-se a qualquer
terceiro que estava desenvolvendo relação possessória com o bem, ou se esse
terceiro era restritivo aos detentores, que se relacionavam com o bem, em uma
relação de detenção, como um servidor da posse em nome do alienante.
Com o
desiderato de esclarecer essa contradição doutrinária a jurisprudência
brasileira se posicionou acerca dessa questão. Apresentavam-se respeitáveis
precedentes em ambos os sentidos. Alguns magistrados realizavam uma
interpretação stricto sensu da expressão “terceiros que o detenham”, para estes
apenas as pessoas que estavam sob um vínculo de subordinação com o alienante
poderiam se situar no polo passivo dessa ação. Outros magistrados realizavam
uma interpretação lato sensu, para eles poderia configurar no polo passivo da
ação de imissão de posse qualquer terceiro que estivesse se relacionando com o
bem. Nessa ocasião, mesmo havendo um árduo conflito, predominou a interpretação
restritiva do polo passivo.
4. A AÇÃO DE IMISSÃO NA POSSE
NO SISTEMA BRASILEIRO DEPOIS DE 1973
Em 1973,
o Código de 1939 foi reformado com base no anteprojeto do Ministro Alfredo
Buzaid. Pela Lei n. 5.869 de 11 de janeiro de 1973, o Código de Processo Civil
foi promulgado. Tal código trouxe modificações acerca da ação de imissão na
posse, pois não a prevê expressamente. Alguns doutrinadores contestaram a
existência dessa ação no ordenamento jurídico brasileiro, pois o atual Código
de Processo Civil não contempla seu nome, apenas o passado. (“No entanto, essa
discussão já foi dirimida, pela CF)”.
A ação
de imissão na posse, portanto, persiste no ordenamento jurídico brasileiro, no
entanto, questões envolvendo a legitimidade das partes que podem configurar o
litígio ainda não são pacíficas nem na doutrina nem na jurisprudência pátria.
O anteprojeto
do Código de Processo Civil, o qual está sob análise do Congresso Nacional,
também incorre na mesma ausência do Código de 1973, pois não prevê a ação de
imissão na posse, bem como não esclarece nenhum dos pontos conflituosos e
divergentes dessa ação. Permanecendo, desse modo, o estudo, aplicação e
esclarecimentos acerca desse instituto um ônus para doutrina e para jurisprudência.
5. Conclusão
Acerca
da natureza da ação, se é petitória ou possessória, mesmo visualizando que a
jurisprudência posiciona-se majoritariamente em entendê-la como petitória,
observa-se que ao compreendê-la dessa forma restringe-se seu polo ativo, pois
apenas o proprietário poderá se socorrer dessa demanda para proteger a sua
posse. Portanto, mais eficaz seria o posicionamento dos tribunais brasileiros
se seguissem o que é ensinado pela doutrina e a encarassem como uma ação
possessória.
Quanto à
legitimidade passiva, sob a égide do Código de Processo Civil de 1939, mesmo
havendo o conflito acerca da interpretação a ser dada a expressão “terceiro que
o detenham”, prevaleceu o entendimento que esse terceiro seria apenas o
detentor que se relacionaria com o bem sob o vínculo de subordinação com o
alienante.
No
entanto, na vigência do Código de Processo Civil de 1973 essa interpretação
deve ser modificada. Pois, ação de imissão na posse não está prevista
expressamente, desse modo, apresenta-se arriscado atribuir uma interpretação
restritiva a uma expressão que não está prevista na lei, baseando-se em um entendimento
jurisprudencial de décadas anteriores. Em vista disso, a legitimidade passiva a
ser demandada em uma ação de imissão na posse deve ser qualquer pessoa que
esteja se relacionando com o bem, independente de haver qualquer vínculo, ou
ligação, com o alienante.
Referências
DINIZ,
Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. vol. 4: direito das coisas.
25. Ed. São Paulo: Saraiva 2010.
FARIAS
Cristiano Chaves de. ROSENVALD, Nelson. Direitos reais. 6. Ed. Rio de Janeiro:
Lumen Juris, 2010.
FULGÊNCIO,
Tito. Da posse e das ações possessórias. Vol. 1. 9. Ed. Rio de Janeiro:
Forense, 2000.
SILVA,
Ovídio Araújo Baptista da. Ação de imissão na posse. 3. Ed. São Paulo: Revistas
dos tribunais, 2001.
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Os
autores do artigo são acadêmicos e pesquisadores do curso de Direito da
Universidade de Fortaleza – UNIFOR.
Olá. ...gostaria de saber qual outro entende que seria possessoria? Grata
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