FUNÇÃO SOCIAL SE CONTRAPONDO
AO CARÁTER
ABSOLUTO DA PROPRIEDADE
Jéssica Cristina Melo de
Matos[1]
Natália Moura Furtado[2]
Thais Pinheiro Felipe[3]
INTRODUÇÃO
A partir da Constituição Federal de 1988, o princípio da
função social da propriedade foi positivado, tornando-se direito fundamental.
Isso fez com que todos os aparatos legais, como Código Civil, Estatuo da Cidade
e Lei 11.977/09 passassem a observar esse princípio nas relações jurídicas que
envolvem propriedade.
Esse princípio limitou o caráter absoluto de propriedade,
pois o titular desse direito real não poderá desfrutar como quiser dessa, pelo
fato de poder vir a sofrer restrições de ordem constitucional, administrativa,
civil e militar.
RESUMO
O foco deste trabalho é a
importância da função social da propriedade. Seu objetivo é revelar que essa não é mais vista sob o
aspecto absoluto. A metodologia utilizada foi de caráter descritivo e
bibliográfico, por meio de livros de Direito Civil, artigos científicos, e
legislação brasileira. A partir dessas fontes, foi possível observar que, desde
a a positivação do princípio da funçao social como direito fundamental na
Constituição Federal, o seu caráter absoluto tornou-se relativo.
Palvras-chaves: Função
Social. Propriedade. Caráter Absoluto
RESULTADOS
O direito da propriedade:
é aquele que uma pessoa
singular ou coletiva efetivamente exerce numa coisa determinada em regra
perpetuamente, de modo normalmente absoluto, sempre exclusivo, e que todas as
pessoas são obrigadas a respeitar. (Gonçalves
apud Gonçalves, 2012, p. 206)
De acordo com o exposto, a propriedade possui caráter absoluto, por ser o mais
completo dos direitos reais e pelo fato do seu titular puder desfrutar do
bem como quiser, sujeitando-se apenas às limitações
impostas em razão do interesse público ou da coexistência de direito de
propriedade entre outros titulares. Assim, este
direito real é um poder exclusivo, ou seja, é exercido por um titular, mesmo no
instituto do condomínio, como explica Diniz (2010, p 132):
[...] convém esclarecer
que no caso do condomínio, não desaparece essa exclusividade, porque os
condomínios são, conjuntamente, titulares do direito, O condomínio implica uma
divisão abstrata da propriedade, pois cada condômino possui uma quota ideal do
bem.
Além
disso, configura-se como um direito perpétuo, pelo fato de que não extingue
pelo falta de uso, pois enquanto não sobrevier causa extintiva legal ou
oriunda da própria vontade do titular, esse direito não perece. Também é um
direito elástico, pois poderá haver a transferência dos poderes inerentes
a propriedade a outrem, sem que o dono perca a sua propriedade e, quando for
extinta essa limitação, será readquirida a plenitude dos seus poderes.
Em relação à propriedade, o
legislador não normatizou o seu conceito, mas elencou os seus elementos no
artigo 1228 do Código Civil, que dispõe que "o proprietário tem a
faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de
quem quer que injustamente a possua ou detenha".
O uso se refere ao direito que o proprietário
possui de empregar a coisa como queira. A faculdade de gozar significa extrair
do bem seus benefícios e vantagens, como a percepção dos frutos. O direito de
dispor é referente ao fato de o dono ter a possibilidade de alterar a
substância da coisa, agravá-la ou aliená-la, enquadrando-se, assim, no
direito mais abrangente do proprietário, pois quem pode dispor também pode usar
e gozar. Em relação ao poder de reaver, refere-se ao direito de
sequela, ou seja, de seguir ou buscar a coisa com quem quer que esteja.
A
Constituição de 1988 flexibilizou o entendimento de que não é mais viável
sustentar um conceito absoluto de propriedade, dado que
o proprietário está sujeito a restrições, não só de caráter
administrativo, militar ou advindo do Código Civil,
mas, principalmente, de ordem pública, que é a sua função social. Desse modo, a
propriedade assume uma natureza absoluta relativizada, conforme expõe Venosa (2012,
p.178): "o direito de propriedade é
absoluto dentro do âmbito resguardado do ordenamento", ou seja, o
proprietário terá o seu direito condicionado às restrições legais, senão não
será protegido pelo sistema jurídico.
Assim, a função social atinge
a substância do direito de propriedade, pois a justa aplicação desse direito
dependerá do ponto de equilíbrio entre o interesse coletivo e o individual.
Isso mitiga a sua natureza absoluta, tornando a propriedade um meio social,
onde o proprietário só será resguardado, pela constituição, se desenvolver uma
função social nessa.
Portanto, afasta-se o individualismo
histórico, que não somente busca coibir o uso abusivo da propriedade, como
também procura inseri-la no contexto de utilização para o bem comum.
A Constituição Federal de 1988 adotou o princípio da
função social da propriedade. Como a CF/88 é a norma hierarquicamente superior,
todos os outros aparatos legais brasileiros devem obedecer aos princípios
constitucionais. Consequentemente, as leis que regulam o direito real, como
Código Civil, Estatuto da Cidade e Lei 11.977/09, por exemplo, passaram a
observar a norma supracitada nas relações jurídicas referentes à propriedade.
Um dos institutos jurídicos que revelam a aplicação da
finalidade social na propriedade é o usucapião. Este busca proteger quem está
fazendo o bom uso da propriedade, e não valorizar quem não a utiliza ou faz mal
uso dessa, caracterizando-se, assim, o seu duplo caráter, como explica Nader (2010,
p.111), “ao mesmo tempo em que o possuidor adquire o domínio da coisa, o
proprietário a perde”.
Apesar de o meio judicial de proteção à propriedade, ação
reivindicatória, ser imprescritível, há uma exceção, o usucapião. Daí, pois,
ser chamado de prescrição aquisitiva, segundo Nader (2010), já que, uma vez
decorrido o lapso temporal exigido em lei, há uma aquisição da propriedade.
O usucapião é uma forma de adquirir a propriedade
independentemente de vontade do proprietário anterior, em que se regulariza uma
situação de fato, transformando-a em jurídica, desde que atendidos os
requisitos legais. Segundo Venosa (2012), esses são: posse ad usucapionem, em que há animus domini, ou seja intenção de ser
dono, não permitindo a quem seja detentor, locatário, comodatário, por exemplo;
pacífica, não sendo contestada pelo legitimado; contínua, sem intervalos de
tempo; e justa, sem vícios de violência, clandestinidade ou precariedade.
Há sete modalidades de usucapião: extraordinária
(prevista no artigo 1.238 do Código Civil - CC), ordinária (artigo 1.242 CC),
constitucional especial rural (1.239 CC e 191 CF), constitucional especial
urbana (artigo 1.240 CC e 183 CF), coletiva (artigo 10 do Estatuto da Cidade -
Lei 10.257/01), familiar (1.240-A CC), extrajudicial ( Lei 11.977/09).
Os caputs dos artigos 1.238 e
1.242, referentes à usucapião extraordinária e ordinária, respectivamente, não
exigem uma finalidade, como moradia, trabalho, como se requere nas outras
modalidades. Porém, em seus parágrafos únicos, o legislador privilegiou o
possuidor que atender à função social, reduzindo em cinco anos, o prazo para
usucapir.
Com exceção dos caputs supracitados, observa-se que a lei estabelece um
fim, seja social ou econômico, a todas as modalidades de usucapião, além dos
requisitos já mencionados.
CONCLUSÃO
Diante do exposto, pode-se observar as características da
propriedade, dentre as quais, os seu caráter absoluto, o qual passou a sofrer
alterações a partir da inserção da função social, na Constituição Federal de
1988.
Atualmente, o caráter absoluto da propriedade é mitigado
pelo princípio da função social, tendo como exemplo prático, o instituto jurídico
do usucapião. A partir deste, nota-se que o ordenamento jurídico brasileiro
protege quem faz bom uso da propriedade e não valoriza quem não faz.
REFERÊNCIAS
BRASIL. Código Civil de 2002. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>
Acesso em: 13 mar. 2013.
______. Constituição Federal
de 1988.
Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406.htm> Acesso em: 13 mar.
2013.
______. Lei 10.257/01. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/leis_2001/l10257.htm> Acesso em: 13 mar.
2013.
______. Lei 11.977/09 . Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2009/lei/l11977.htm> Acesso em: 13 mar.
2013.
DINIZ. M. H. Curso de Direito Civil Brasil - Direito das Coisas. 27 ed. São Paulo: Saraiva,
2012. v.4.
GONÇALVES, C. R. Direito
Civil Brasileiro - Direito das Coisas. 7 ed. São Paulo: Saraiva,
2012. v.5.
NADER, P. Curso de direito
civil: direito das coisas. Rio de Janeiro: Forense,
2010. v.4.
VENOSA, S. S. Direito Civil: direitos reais. v.5. 12
ed. São Paulo: Atlas, 2012. v.5.